Estudo realizado na Faculdade de Educação (FE/USP) traça um panorama a respeito da Universidade Federal do ABC (UFABC). Instalada em dois campi, em Santo André e São Bernardo do Campo, no ABC paulista, a instituição tem um projeto pedagógico diferenciado, oferecendo cursos com viés interdisciplinar: os bacharelados em Ciências & Tecnologia (BC&T) e Ciências & Humanidades (BC&H), ambos com duração de três anos. Após a primeira parte da graduação, o aluno pode, posteriormente, completar sua formação com outras carreiras oferecidas pela universidade, como Economia, Engenharia ou Licenciaturas em Matemática, Física e Filosofia, por exemplo. “Trata-se, sem dúvida, de uma proposta inovadora, que tenta dar ao aluno liberdade de escolher o que quer fazer”, avalia a historiadora Tatiana Carvalho, autora da pesquisa.
Porém, o projeto ainda é mal compreendido pelos alunos e pela sociedade, aponta a pesquisadora. “Boa parte das pessoas está acostumada com cursos de formação voltados para o mercado. A maioria dos ingressantes em BC&T almeja fazer Engenharia, e não o bacharelado. São pouquíssimos os estudantes que param na primeira graduação”, explica Tatiana. Ela ressalta que tal ideal vai contra as intenções da universidade, que quer se tornar um lugar voltado para a pesquisa – 52% dos 510 alunos matriculados na pós-graduação contam com bolsas auxílio, da Capes, Fapesp, CNPq ou da própria UFABC. Outro pilar importante do projeto da Federal do ABC é a inclusão: 50% de suas vagas são destinadas a estudantes da rede pública de ensino.
Problemas: evasão e interdisciplinaridade
A distância entre as perspectivas da academia e do mercado é, segundo Tatiana, a principal causa para a evasão: quase 50% dos ingressantes em BC&T deixaram o curso — um percentual acima da média para os cursos de Exatas. “Um levantamento interno da UFABC, apontou outras razões. São elas: a falta de prestígio da instituição; a dificuldade das disciplinas, que são trimestrais, mas com o mesmo conteúdo que uma semestral teria; a falta de traquejo de alguns professores, que são, em grande parte, jovens doutores; e, por fim, a dificuldade de conciliar estudo e trabalho”, conta a pesquisadora.
O caráter interdisciplinar do currículo também é questionado por muitos alunos da instituição. “Muitas disciplinas têm problemas porque seus professores ainda não entenderam a proposta, uma vez que vieram de outras universidades, que usam o modelo tradicional”, comenta Tatiana, cujo estudo se baseou em entrevistas com alunos, professores e funcionários da instituição e também em análises do projeto pedagógico e de documentos relativos à UFABC.
“No ABC, e não do ABC”
Outro tema importante da pesquisa é a maneira como a universidade se insere no local onde se encontra, o ABC paulista. A região atualmente passa por uma crise que já dura cerca de duas décadas, após a fuga das montadoras, que outrora foram a causa de seu desenvolvimento econômico. “Antes de sua fundação, a UFABC era vista por parte da opinião pública regional como um possível instrumento para superar essa crise, formando profissionais de acordo com a demanda da região. Entretanto, ela tem outra proposta: tornar-se um centro de pesquisa, transformando a região em um polo tecnológico, como hoje faz a Unicamp com a área de informática. Ainda assim, existem muitas críticas dizendo que a ‘Federal’ é apenas no ABC, e não do ABC”.
Na visão da historiadora, “a região ainda não despertou” para o potencial da universidade. Porém, ela mesma acrescenta que “ainda é cedo para dizer o que vai se fazer da UFABC nos próximos cinco ou dez anos. A impressão que fica, porém, é que ela não quer ser como a USP. Ela quer ser a UFABC: grande, mas do seu próprio jeito”.
A dissertação de mestrado Universidade Federal do ABC: uma nova proposta de universidade pública? teve a orientação da professora Sônia Maria Portella Kruppa e foi defendida em abril de 2011.
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